Aumento do número de assaltos no Leblon leva moradores a alterarem rotinas
segunda-feira, 20 de maio de 2013O ponto final da caminhada da advogada Ruth Gouvêa na tarde de domingo pela Avenida Ataulfo de Paiva era o Shopping Leblon, onde pretendia comprar um chip novo de celular para o neto, assaltado na semana passada. O trajeto, no entanto, foi interrompido perto da Rua Cupertino Durão. Ali, um homem se aproximou e falou calmamente: “Me dê tudo que a senhora tem”. Por tudo se entendiam os R$ 180 de sua carteira, mas nenhum celular, deixado em casa por precaução. Afinal, há duas semanas, Ruth já tinha perdido um aparelho em outro assalto no bairro, em local próximo aos tapumes das obras da Linha 4 do metrô na Praça Antero de Quental. A sensação de insegurança nessas e em outras áreas do Leblon tem mexido com a rotina de moradores, que recorrem a estratégias como mudar seus trajetos diários, carregar celulares velhos e desabafar nas redes sociais.
— Fiquei muito nervosa e voltei para casa imediatamente. A situação não está nada fácil. É meu terceiro assalto no Leblon este ano. Coloquei um relato no Facebook. Com os tapumes do metrô, a situação piorou, porque as passagens ficaram estreitas e isoladas. No penúltimo assalto, perdi o iPhone e dinheiro para um homem que pediu para eu acender o cigarro dele. No outro, na frente do supermercado Zona Sul da Rua General Artigas, levaram a carteira. Eram dois homens, e um estava armado — relembra a advogada, que diz não ter procurado a delegacia do bairro, a 14ª DP (Leblon), porque já está cansada de registrar assaltos.
Segundo os índices do Instituto de Segurança no bairro do Leblon (ISP), no primeiro trimestre deste ano, foram registrados 120 casos de roubo a transeunte na 14ª DP (que também recebe casos do bairro de Ipanema), um aumento de 32% em relação ao número de registros no mesmo período de 2012. As ocorrências de roubo de celular mais que dobraram, subindo de 17 para 39 casos na comparação entre os mesmos dois trimestres.
Descrente da ação policial, a estudante de psicologia Laís Monteiro, de 19 anos, que teve o celular roubado na frente de casa, na Avenida Ataulfo de Paiva, há três semanas, diz que não registrou o episódio porque “acha que não serve para nada além de estatística”. Seu prédio fica entre a Avenida Borges de Medeiros e a Rua Almirante Pereira Guimarães, em frente a um dos canteiros de obras do metrô, onde se formou um corredor comprido e estreito, que ela chama de “sinistro”:
— Eu estava na porta de casa, passou alguém de bicicleta e arrancou o celular da minha mão. Já vi vários casos. Outro dia arrancaram o cordão do pescoço de uma mulher na minha frente. Também alguém de bicicleta. Não posso nem ouvir o barulho de uma bicicleta que fico apavorada. Chegar em casa à noite está impossível. Tenho tentado entrar pela garagem do prédio, na rua lateral. Instalaram câmeras, mas servem de quê? Precisava era ter seguranças. Moro aqui desde os 7 anos e nunca tinha sentido esse medo.
Loja serve como esconderijo
As câmeras a que a estudante se refere foram instaladas em março pelo consórcio Linha 4 Sul (responsável pelas obras do metrô) nos trechos da Ataulfo de Paiva interditados pelas intervenções: entre as avenidas Borges de Medeiros e Afrânio de Melo Franco, e entre as ruas Bartolomeu Mitre e General Urquiza. Segundo o consórcio, são mais de 30 câmeras, que transmitem as imagens para o 23º BPM (Leblon).
No segundo trecho de obras, perto da Praça Antero de Quental, o fim da tarde de domingo foi movimentado. Segurança das Lojas Americanas que ficam no local, Wellington Souza conta que duas jovens entraram correndo no local fugindo de um assaltante por volta das 17h. Uma hora antes, uma senhora tinha passado por ali avisando que um homem de calça branca estava assaltando no corredor dos tapumes perto da esquina da Rua General Urquiza. Duas vendedoras da mesma loja afirmam que, após a instalação dos tapumes, a loja fica vazia mais cedo e o número de roubos aumentou. No sábado, um homem levou um aparelho de DVD. As duas, grávidas em fim de gestação, com medo de sofrer violência, apenas assistiram ao roubo pelo circuito interno. Numa noite de domingo, com pouco movimento na rua, o isolamento da área provoca ainda mais medo. Precisando tirar dinheiro, as moradoras Maria Aparecida Bittencourt e Ângela Bittencourt tentaram a sorte ali num caixa eletrônico no domingo à noite:
— Tenho verdadeiro pavor de andar aqui, só que precisava tirar dinheiro. Moramos aqui perto, mas vamos pegar um táxi. Não dá mais para ir a pé de jeito nenhum — diz Maria Aparecida.
Também moradora do bairro, Alba Zaluar, pesquisadora do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj, com ênfase no estudo das violências, diz que não se pode chegar ao ponto de ver a população com dificuldade de sair de casa:
— Se o morador não está conseguindo sair de casa para trabalhar ou se divertir, o problema está ficando sério. A polícia precisa dar segurança a essas pessoas, aumentando o policiamento e usando a tecnologia para saber onde o policiamento deve estar. É preciso oferecer sistemas ágeis de denúncia. A polícia deveria estar mais atenta ao que está acontecendo. De fato, as áreas dos tapumes são convidativas a assaltos. Recomendo que liguem para o Disque-Denúncia. Se todos fizerem isso, vai ser possível calcular a gravidade da situação.
Foi o que fez o engenheiro Raphael Carvalho, de 33 anos, depois de viver um assalto à mão armada, ao meio-dia da última terça-feira, na Praia do Leblon. Ele estava parado no engarrafamento quando viu um homem se aproximar:
— Com as mudanças no trânsito por causa das obras (do metrô), a praia tem ficado sempre parada. Vi o homem vindo na direção do meu carro, mas não imaginei que seria assaltado ao meio-dia em plena Praia do Leblon. Ele bateu no vidro e eu ignorei. Aí, ele sacou a arma e bateu de novo, dessa vez, com o cabo da arma. Abri com a arma apontada para mim. Ele levou dinheiro, relógio, celular e, antes de ir embora, falou: “Fica com Deus”.
Jardim de Alah tem vários casos
Outra área que tem sido palco de assaltos fica nos fundos da Cobal do Leblon, abrangendo as praças Cláudio Coutinho e Ministro Romeiro Neto e parte das ruas Humberto de Campos, José Linhares e Cupertino Durão. O filho de 14 anos da fonoaudióloga Lucia Helena Ferreira sofreu três tentativas de assalto nos últimos três meses nessa área. Ela mudou os horários das aulas de tênis do menino no clube do Flamengo e os trajetos que ele faz para suas atividades:
— Coloquei a aula num horário em que alguém possa buscá-lo. Tem um grupo assaltando muitos alunos do Santo Agostinho. Eles agem na hora da saída do colégio. Na última vez em que foram atrás do meu filho, ele se refugiou no supermercado Pão de Açúcar e fui buscá-lo. Isso não era assim. Precisa de policiamento.
Essa é a principal reivindicação da presidente da Associação de Moradores e Amigos do Leblon (AMA-Leblon), Evelyn Rosenzweig. Ela conta receber e-mails diários sobre casos de assaltos, muitos deles informando que o criminoso estava a bordo de uma bicicleta. Com base nesses relatos, ela diz que outras vias problemáticas têm sido as avenidas General San Martin e Afrânio de Melo Franco, além do Jardim de Alah como um todo, onde comerciantes e seguranças de restaurantes relatam vários casos de assalto.
O comandante do 23º BPM (Leblon), tenente coronel Luiz Otávio, nega que haja uma onda de assaltos e pede aos moradores que registrem os casos na delegacia para ajudar o planejamento da PM. Ele garante ainda que o policiamento no entorno das obras do metrô foi reforçado.